sábado, 27 de junho de 2009

Le Nui


Em questão de segundos, todas as luzes se apagaram interrompendo bruscamente a diversão dos curiosos. Ainda assim, havia aqueles que não parariam nem se o mundo acabasse. Mas houveram olhos suficientes para presenciar a cena. Do mesmo modo que se apagaram as luzes, ascenderam-se holofotes. Todos, voltados para um mesmo ponto. Olhos, focos de luz, carteiras, cacetes! Todos mirando aquela que, talvez, não fosse a mais bela da noite, mas certamente era a mais atraente naquele momento. Aquela criatura quente, aparentemente tão leve, imóvel, tão longe do chão, dependurada naquela barra de ferro tão gélida.

Lentamente, um melancólico violoncello dá início a seus lamentos, e ela começa a, gentilmente, escorregar até o chão. Silêncio novamente. Os olhos daqueles que já haviam esquecido de suas putas e distrações agora olhavam fixamente para aquela figura que estava ali, deitada, inerte, iluminada pelas luzes... Uma só batida de uma bateria eletrônica rasgou o silêncio e mil sons diferentes a seguiram movendo aquela mulher. Uma perna subiu, outra. Em instantes, estáticas e, depois do que pareceu eternidade, elas se abriram com outra batida da bateria arrancando suspiros. Vagarosamente, voltaram a subir e se dobraram. Jogadas para um lado, para outro e, com apenas um movimento, ela rolou para ficar de joelhos. Com a cabeça encostada nos joelhos, ela escondia sua identidade. Mas por pouco tempo. Mais um movimento leve e ligeiro e começa a levantar. Nádegas primeiro; afinal, era isso que eles queriam, não? Por último, a cabeça foi ao topo. Agora, podiam ver seu rosto, sua identidade não era mais secreta.

Com sapatos altíssimos, uma meia-calça arrastão, uma saia até os pés com rachas até a cintura, um piercing no umbigo refletindo a luz dos holofotes, um top que mal lhe cobria os seios e uma máscara sorridente, a dama da noite jogou um braço para o lado e agarrou a barra metálica que se encontrava ao seu lado. A música se tornou mais animada e ela largou seu corpo a girar em volta daquele poste. Pegou impulso e jogou suas pernas para o ar. Agora, com as mãos segurando todo seu corpo já todo encurvado e suas pernas totalmente abertas, ela parou por um segundo para encarar a platéia. Rostos alegres e vulgares gritando, urrando por mais. Queriam vê-la sem roupa. Foi se tornando parte daquele ferro frígido ao passo que suas pernas iam subindo e se enroscando nele. Lentamente, desceu de novo,. Quando sua cabeça tocou no chão, seu corpo rolou para trás com as pernas abertas e caiu de costas para o público. Deu uma cambalhota para trás e, caindo de joelhos, já deu um impulso para se erguer novamente. Mais uma perna no ar, desta vez sustentada por um braço que a segurava. Seu tronco foi jogado em direção ao chão, fazendo sua perna subir mais ainda. Com as duas mãos no chão, jogou a outra perna ao ar. Perfeitamente retas, como os ponteiros de um relógio virados para lados opostos, foram descendo junto com seu corpo todo. Queixo, peitos, costelas e um joelho tocou o chão, vagarosamente, escorregando para que ficasse ali atirada. De alguma forma, sempre conseguia ser graciosa ao levantar, pois lá estava ela de novo, no poste. Mais giros e rodopios, e mais pernas pro ar, e mãos! Mais suspiros. Pavor, ansiedade, excitação. Tudo ao mesmo tempo para o orgasmo perfeito. As putas que tinham que se contentar com o sexo já haviam desistido. Estavam tentando encontrar um lugar na carteira dos recém chegados. Nem assim, conseguiam.

O sexo estava no ar. Toda aquela excitação, a luxúria, as luzes, a música, os olhares. Seu ato estava chegando a seu fim, ela sabia, mas eles não. Seres insaciáveis. Sempre querendo mais. O chão ao seu redor já estava coberto de notas de algum valor, além das que estavam em sua roupa. Chegara a hora. Abriu sua saia e aos poucos foi mostrando o pouco que ainda estava coberto. Coxas e nádegas afogando o fino fio que ali se encontrava presente. Uma calcinha fio-dental preta e vermelha. O alvo para os touros da noite. Mais um pouco de dança. E, mais uma vez, ao chão; para fazer sua última súplica por seu salário, a recompensa pelo que estava e pelo que ia mostrar a seguir. Rolava pelos cantos do palco, engatinhava, enquanto ia recebendo, uma a uma, as frações seu valor. De pé, de novo! A música ficou mais lenta, mais sensual. E, com isso, saiu, aos poucos, seu top. Com os seios à mostra, voltou à barra mais uma vez e deu seu último giro. Mesmo com a dor da longa noite, não tirou o sorriso malicioso do rosto. Deu algumas voltas pelo palco, subindo e descendo suas mãos pelo corpo, engatando os dedos nos fios da calcinha, ameaçando tirá-la. Não dava tempo. Em um único e vagaroso movimento, jogou seu corpo para trás e foi descendo sua cabeça até tocar no chão. Com as mãos ainda no meio de suas pernas, ficou ali, estática até as luzes se apagarem.

Jogou seu corpo no chão e deu um suspiro. Levantou-se e foi se trocar. Ainda ouvia os urros e assobios de dentro do camarim. Acendeu um cigarro e começou a tirar a maquiagem. Agora, não precisava mais da máscara; poderia ficar séria, triste, braba; não precisava mais sorrir; não até a próxima noite. Estava cansada, exausta. Não se sentia a mesma no palco. Lá, não sentia o cansaço chegando, não sentia os pés doendo, as bolhas se formando, o suor escorrendo, levando junto a maquiagem.

Agora, com uma calça jeans rasgada nos joelhos por cima de uma meia-calça grossa, uma blusa bem confortável e uma bem quente pendurada nos braços, começou a se despedir.

- Bon soir, mes amours!

- Bon soir, chérie!

Para sua sorte, morava a duas quadras do seu local de trabalho. Morava no quinto andar de um prédio velho e sem elevador. Logo que entrou, sem pensar, tirou as botas e subiu com os pés descalços. Teve um pouco de dificuldade de abrir sua porta, que não era tão velha quanto o prédio, mas nem tão nova. Assim que entrou, largou suas coisas pelo chão e se atirou no sofá. Ao raiar do sol, estava terminando mais um dia de trabalho. Após alguns segundos de descanso, levantou-se, foi até seu quarto, atirou-se na cama e dormiu.




E este foi um dos últimos contos escritos para a aula de Escrita Criativa do professor Charles Kiefer, em que eu levantei da cama as três horas da manhã e despejei palavras no computador para criá-lo. Infelizmente, as aulas acabaram... Mas vou continuar escrevendo.

Espero que tenham gostado.



Kisses! ;*

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